A Comissão de Enfrentamento ao Coronavírus da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte discutiu, na tarde desta segunda-feira (22), a atuação do Estado dentro do Consórcio Nordeste e possíveis implicações aos gestores em caso de uso indevido de verbas públicas. O procurador-geral de Contas, Thiago Guterres, participou da discussão, prestou esclarecimentos e informou sobre o que está em investigação. Parlamentares criticaram a postura do Consórcio Nordeste na compra de respiradores que não foram entregues aos estados.
Composta pelos deputados Kelps Lima (SDD), Getúlio Rêgo (DEM), Tomba Farias (PSDB), Francisco do PT e Hermano Morais (PSB), a comissão relembrou a forma como o Rio Grande do Norte participou da compra de 300 respiradores pelo valor aproximado de R$ 50 milhões, onde o Estado gastou quase R$ 5 milhões para receber 30 respiradores. No entanto, os valores foram pagos e os equipamentos não foram entregues, o que gerou ação policial e investigação sobre o caso. O procurador-geral de Contas do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Norte, Thiago Guterres, explicou as normas que devem seguir os consórcios, tanto na formação quanto nas compras.
Enaltecendo a importância e eficiência do conceito dos consórcios, Guterres explicou que há exemplos bem sucedidos de grupos formados entre entes públicos e federativos. Sobre o enfrentamento ao novo coronavírus, o procurador explicou que há três processos dentro do TCE, entre eles a apuração acerca do Consórcio Nordeste.
Conforme explicou o procurador-geral de Contas, a atuação dos órgãos de controle com relação aos consórcios é controversa, mas o que está posto na lei é que, quando se envolvem estados, o trabalho para investigações do consórcio deve ocorrer pelo TCE do estado onde está o núcleo do grupo. Nesse caso, o TCE da Bahia. Já para os demais tribunais de contas dos estados do Nordeste, cabe a análise sobre os contratos de rateio - que é o caso da compra dos respiradores.
Segundo Thiago Guterres, os trâmites sobre a compra, ordem dos pagamentos e justificativa para a escolha da empresa são questionamentos que foram feitos e ainda precisam das respostas. Porém, o procurador-geral de Contas falou a cautela antes de se fazer pré-julgamentos.
"Não se pode fazer juízo de culpabilidade nesse momento. As circunstâncias ainda estão sendo apuradas, o processo está no início e temos que aguardar isso. A lei diz que o agente público só responderá pessoalmente por suas decisoes em caso de dolo ou erro grosseiro. Tudo isso tem que ser levado em consideração e só as circunstâncias do caso vão demonstrar se isso de fato ocorreu", disse o procurador, afirmando que ainda aguardava respostas por parte do Executivo potiguar sobre a compra.
Membro da comissão, o deputado Francisco do PT ressaltou que o próprio Consórcio Nordeste que denunciou a empresa que recebeu pela compra dos respiradores e não entregou os equipamentos. O parlamentar disse que é preciso que os responsáveis, em caso de fraude, sejam punidos de maneira severa.
"Os respiradores foram pagos e não foram entregues, isso é um fato. O processo tem que ir até o final e, se alguém cometeu crime, tem que ser punido", disse o deputado, que também questionou se havia alguma recomendação por parte do TCE ou do MPjTCE para que o Rio Grande do Norte saia do Consórcio Nordeste ou deixe de fazer os repasses referentes à taxa de administração. "Não há essa recomendação", respondeu o procurador-geral de Contas.
Também membros da comissão, os deputados Getúlio Rêgo e Hermano Morais pregaram prudência na avaliação e aguardam o desenrolar das investigações acerca da compra realizada pelo Consórcio Nordeste. O deputado Tomba Farias, por outro lado, enumerou o que entendeu serem indícios de irregularidades cometidas pelo Consórcio, como os preços dos respiradores, a contratação de uma empresa que tinha capital de R$ 100 mil para fazer uma compra de R$ 50 milhões, além da própria delação da responsável pela empresa que confirmou o pagamento de R$ 12 milhões a título de "comissão" a pessoas envolvidas.
"Será possível que ninguém olhou essa empresa antes de fazer uma compra de R$ 50 milhões?", questionou Tomba Farias.
Presidente da Comissão, o deputado Kelps Lima afirmou que o Consórcio Nordeste não tem respeitado fundamentos básicos da gestão pública, como transparência, legalidade, eficiência, moralidade e impessoalidade. Para Kelps, a falta de dados públicos demonstra a falta de transparência, a perda de quase R$ 50 milhões em uma compra frustrada mostram ineficiência, enquanto a compra com pagamento antecipado fere a legalidade, a presença de um investigado na Lava Jato na gestão do grupo demonstra falta de preocupação com a moralidade e a falta de ações conjuntas com adversários políticos regionais demonstra que não está se respeitando a impessoalidade. "O consórcio não cumpre o básico dos princípios da administração pública", criticou Kelps.
O deputado também questionou o procurador de contas sobre a possibilidade de que o contrato com a empresa investigada possa caracterizar ato de improbidade administrativa por parte dos gestores e se o TCE pode recomendar a suspensão de repasses ao Consórcio ou até a saída do grupo.
"Não tenho a menor dúvida. Mesmo sem a exigência de garantias, não se alterou a necessidade de motivar e apresentar as razões da escolha da empresa. Se a escolha não é razoável, não tenho dúvida de que pode resultar em ato de improbidade administrativa. Até a economia de recursos tem que ser avaliada. A compra antecipada gerava economia de recursos? Porém, precisamos das informações que solicitamos antes de se fazer qualquer recomendação", explicou o procurador de Contas.
Ainda na reunião, os deputados decidiram ouvir em outra oportunidade o procurador-geral do Estado, Luiz Antônio Marinho, que não participou do encontro desta tarde devido a problemas em sua conexão à internet. A comissão pretende ouvir o procurador na próxima semana, já na segunda-feira (29).